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A proliferação dos Joesleys digitais, ou, fazendas de cliques

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A proliferação dos Joesleys digitais, ou, fazendas de cliques

"Hoje, todo adulto que esteja disposto a pagar o preço, pode ter milhares deles, provando, definitivamente, que dinheiro compra amizade. Os webfundiários, donos destas fazendas, verdadeiros Joesleys digitais, cobram um preço salgado por seus serviços e faturam, dizem, milhões de dólares por ano."


28 de junho de 2017 - 7h41

Por Henrique Szklo (*)

Uma das mais cínicas modalidades de negócios da era digital são as inacreditáveis clic farms, fazendas que vivem de culturas muito peculiares: a produção e venda de cliques e likes. Tanto orgânicos quanto processados.

Startups promissoras, estes estábulos tecnológicos são fraudes virtuais que utilizam-se de técnicas bem criativas para inflacionar o número de curtidas e outras interações online em páginas, aplicativos e perfis na internet, gerando curtidas e seguidores nas redes sociais, como Facebook, Twitter, Youtube, Instagram, etc.

Como eu sempre digo, a categoria profissional mais criativa da espécie humana, desde que o mundo é mundo, é a de criminosos, contraventores e praticantes de ilícitos, sempre muito empreendedores e focados em inovação. Não existe zona de conforto para o crime.

Até outro dia, uma pessoa normal tinha de um a três amiguinhos imaginários durante sua infância. Hoje, todo adulto que esteja disposto a pagar o preço, pode ter milhares deles, provando, definitivamente, que dinheiro compra amizade. Os webfundiários, donos destas fazendas, verdadeiros Joesleys digitais, cobram um preço salgado por seus serviços e faturam, dizem, milhões de dólares por ano.

Podemos encontrar três tipos de fazendas mais comuns: uma que utiliza gente de mentirinha, outra que utiliza bots e uma terceira que utiliza gente de verdade.

O processo produzido por bots, que estão mais para fábricas do que para fazendas, são os menos eficientes, pois o comportamento de robôs, por melhores que sejam seus algoritmos, são razoavelmente fáceis de serem detectados pelas grandes plataformas.

Já as fazendas que utilizam gente de verdade, pagam, em média, um dólar por mil curtidas ou por seguir mil pessoas no Twitter e Instagram. Neste caso é extremamente difícil para que um filtro automatizado das plataformas detecte como falso esse tipo de tráfego, por que, no final das contas, são pessoas de verdade curtindo páginas e seguindo perfis, num comportamento muito parecido com o de um visitante legítimo.

Mas a criatividade dos webfundiários foi mais longe. Conscientes de que empregados humanos são desprezíveis, encontraram uma maneira de livrar-se deles sem precisar recorrer aos bots. Recentemente, um vídeo viralizou mostrando uma fazenda de cliques, supostamente chinesa, onde pudemos observar uma grande parede, repleta de celulares. Um curral de smartphones. Gado com milhares de cabeças falsas funcionando com algoritmos que simulam perfis reais. São arrobas e mais arrobas, a perder de vista. Diferente dos bots, cada um é cada um. E como diz Muricy Ramalho, não existe mais bobo na internet. Sabedores do risco de serem descobertos, os Joesleys digitais não criam muitas contas ao mesmo tempo para disfarçar o link entre elas e utilizam-se de proxies diversos para disfarçar sua verdadeira localização.

Uma pesquisa recente concluiu que aproximadamente 30% das pessoas procuram influencers antes de comprar alguma coisa, medindo sua credibilidade por quantidades de curtidas e de seguidores. Portanto, é flagrante a importância, principalmente do ponto de vista financeiro, de se obter números cada vez mais expressivos para se criar um perfil positivo. E lucrativo.

Umberto Eco disse que as redes sociais deram voz aos imbecis. Concordo. Por isso gostaria que ele estivesse vivo para ouvir a minha ideia. Pensando bem, talvez seja melhor que ele esteja morto, porque ele poderia achar que eu também sou um imbecil. Mas não sejamos maniqueístas. Que tal usar as fazendas de cliques para o bem? O mundo de hoje está tomado de youtubers mentecaptos, blogueiros limítrofes e artistas imprestáveis. Basta alguns milhões de likes e seguidores falsos para melhorar a qualidade do conteúdo na internet, fortalecendo blogs, sites e redes sociais de gente minimamente inteligente. Não é uma boa?

As fazendas de cliques localizam-se geralmente em países emergentes, como China, Índia, Bangladesh, Nepal e Filipinas. E o Brasil? Cadê o Brasil minha gente? Nós somos a terra das oportunidades, precisamos aproveitar esta onda. Minha opinião é que no Brasil as fazendas de cliques sejam contratadas pelo Ministério da Educação e da Cultura. Digo isso porque os influencers que temos hoje no ponto-com-ponto-be-erre me deixa muito preocupado com o futuro de nossa pátria. Precisamos cuidar de nossas crianças. Você já parou para ver quem – ou o quê – eles seguem? Acredite, é assustador. Por isso acredito que nunca os verdadeiros brasileiros precisaram tanto dos falsos brasileiros para fazer um país melhor.

Mas como a carne é fraca, principalmente a dos nossos representantes, não duvido que em pouco tempo articularia-se no Congresso Nacional a Bancada do Clique, cuja missão seria defender os interesses do likenegócio. Todos integrantes financiados pelos Joesleys digitais, claro. Mas e o povo? O que o povo vai ganhar com isso? A conta para pagar, é claro, como sempre. Curtindo ou não. Afinal, esta é e sempre será a parte que vai nos caber deste webfúndio. E como dizia Didi Mocó, laiká nóis laika, mas money qui é good nóis num have.

(*) Henrique Szklo é sócio-fundador da Chikenz, loja de criatividade e desbloqueio criativo.

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